Conforme as empresas chinesas intensificam suas estratégias de expansão internacional, surge um novo padrão: o Oriente Médio está rapidamente se tornando um ponto estratégico para crescimento. Antes ofuscada pela familiaridade e proximidade do sudeste asiático, a região agora atrai um número crescente de empresas chinesas — de setores que vão de tecnologia e manufatura até automotivo e bens de consumo. Essa mudança reflete uma combinação de oportunidades geopolíticas, transformação digital, afinidades culturais e dinâmicas sociais em evolução.

Geoestratégia e oportunidade

Durante anos, o sudeste asiático foi o destino natural para empresas chinesas que buscavam internacionalização. No entanto, à medida que o Oriente Médio se reinventou como um hub econômico e de inovação, ele se apresenta como uma base de lançamento ainda mais atraente. Localizados na encruzilhada entre Ásia, Europa e África, os estados do Golfo — especialmente os membros do conselho de cooperação do Golfo (GCC) — oferecem vantagens geográficas e logísticas incomparáveis. Sua infraestrutura robusta e zonas de livre comércio criam condições favoráveis para empresas com ambições de escala global.

Governos da região passaram a implementar estratégias nacionais ambiciosas, como o Vision 2030 da Arábia Saudita — plano estratégico lançado em 2016 com o objetivo de transformar a economia do país, reduzir sua dependência do petróleo e posicionar o país como um hub global de investimento, inovação e turismo.

Essas reformas estruturais abriram espaço para empresas globais, incluindo as chinesas, a contribuírem não apenas com capital, mas também com expertise em digitalização, infraestrutura inteligente e energias renováveis.

No campo diplomático, ocorre um delicado equilíbrio geopolítico. Tradicionalmente alinhados a potências ocidentais, muitos países do Oriente Médio hoje buscam ativamente estreitar laços com a China como parte de uma política externa mais diversificada. Esse pragmatismo diplomático está se traduzindo em novas oportunidades comerciais.

Impulso digital

A digitalização é uma das maiores forças que impulsionam empresas chinesas em direção ao Oriente Médio. A região possui algumas das maiores taxas de penetração da internet do mundo — chegando a 99% nos Emirados Árabes Unidos e no Catar. Só o setor de e-commerce movimentou US$ 29 bilhões em 2023 e deve crescer a uma taxa média anual de 11%. Para empresas chinesas de tecnologia, com ecossistemas digitais já consolidados, trata-se de um ambiente ideal para replicar e inovar.

Além disso, a demografia da região dialoga diretamente com os pontos fortes da China: mais de 60% da população do Oriente Médio tem menos de 30 anos. Esse público jovem e conectado está cada vez mais aberto a plataformas digitais, marcas globais e novas tecnologias — justamente as áreas onde as empresas chinesas se destacam.

Convergência cultural

Além das condições favoráveis de mercado, o Oriente Médio oferece vantagens culturais significativas para empresas chinesas. Nos últimos anos, a cultura da China passou a ser vista com crescente respeito e admiração na região. Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, por exemplo, têm investido na aproximação cultural com o gigante asiático. A inclusão do mandarim no currículo escolar nacional saudita e o treinamento de centenas de professores de mandarim são evidências do compromisso em aprofundar as relações bilaterais.

Esse movimento cultural se reflete no aumento do número de turistas chineses na região, especialmente em destinos como Dubai e Abu Dhabi. Além disso, negócios locais vêm adaptando seus serviços para esse público, com iniciativas como os comitês “China Ready”, voltados a tornar a região mais acolhedora aos visitantes e investidores chineses. Essa afinidade cultural fortalece os laços entre empresas chinesas e consumidores locais.

Novos horizontes de consumo

Por trás das mudanças econômicas e geopolíticas está uma transformação social. Durante muito tempo, o Oriente Médio foi associado principalemente a conflitos e ao conservadorismo religioso. No entanto, pesquisas recentes de campo mostram uma realidade diferente: apesar de a região ser predominantemente muçulmana, observa-se uma abertura gradual no contexto da globalização. Em especial, as novas gerações demonstram grande receptividade a culturas estrangeiras e tecnologias inovadoras. As estruturas familiares tradicionais continuam fortes, impulsionando a demanda por serviços voltados a famílias em áreas como entretenimento, saúde e educação. Em paralelo, a ascensão das mulheres na vida pública e nos negócios está remodelando os mercados consumidores.

Na Arábia Saudita, por exemplo, a crescente participação econômica feminina gera demanda por novos produtos e serviços nos segmentos de bem-estar, moda, educação e estilo de vida — áreas nas quais as empresas chinesas têm mostrado capacidade de inovação. O resultado é um mercado complexo e em transformação, que recompensa empresas capazes de se adaptar com sensibilidade e agilidade.

De exportador a construtor de marcas

O Oriente Médio também vem se consolidando como um campo de prova para empresas chinesas que buscam se reposicionar de meros fabricantes de baixo custo para criadores de marcas globais. Um exemplo é a Chery, montadora chinesa que personalizou seus veículos com interfaces em árabe e funcionalidades culturais específicas, como a bússola para oração integrada ao carro. Com isso, a Chery não está apenas vendendo automóveis: está sinalizando que o “Made in China” também pode significar “Feito para Você”.

Essas adaptações locais vão além de estratégias de marketing; fazem parte de uma mudança mais ampla na forma como as empresas chinesas competem no cenário global. Ao entrar em mercados mais exigentes no Oriente Médio, atributos como qualidade do produto, construção de marca e conformidade regulatória se tornam não apenas diferenciais, mas imperativos estratégicos.

Uma parceria estratégica para uma nova era

A chegada em massa de empresas chinesas ao Oriente Médio não é fruto do acaso, mas sim resultado de um realinhamento global no comércio, na cultura e na estratégia. Em um mundo cada vez mais multipolar, China e Oriente Médio encontram pontos em comum em suas ambições compartilhadas por modernização, digitalização e diversificação econômica. A região emerge como parceira fundamental na trajetória da China para fora de suas fronteiras — não apenas como mercado, mas como co-inovadora, campo de testes e porta de entrada.

Ao aproveitar a infraestrutura digital, dialogar com consumidores jovens e construir pontes por meio do entendimento cultural, o Oriente Médio oferece às empresas chinesas algo raro: a oportunidade de contribuir para a transformação radical de uma região e, ao mesmo tempo, aprimorar sua própria competitividade global. De energia verde e cidades inteligentes a fintechs e serviços baseados em inteligência artificial, as empresas chinesas não estão apenas exportando produtos — estão cocriando soluções prontas para o futuro ao lado de governos e startups locais. Essa dinâmica entre capital, tecnologia e talento está lançando as bases para uma globalização mais equilibrada e inclusiva.

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LI Yang é professor associado de marketing e vice-reitor do programa de MBA da Cheung Kong Graduate School of Business (CKGSB). Doutor pela Columbia Business School, Li é especialista em aprendizado estatístico de máquinas. Sua pesquisa combina métodos quantitativos avançados com aplicações práticas em marketing e personalização digital.