O lançamento do carro elétrico Su7 foi um marco significativo do supply chain da Xiaomi, enraizada na estrutura tradicional do Beijing Automotive Group – sexto maior fabricante de automóveis da China. Gigantes do setor de veículos elétricos (como Tesla, Xiaomi, NIO e Li Auto), adotaram um modelo de produção terceirizado, com fornecedores de diversos segmentos. Já a BYD adotou uma abordagem de internalização para controlar o máximo possível do processo de fabricação. Essas estratégias podem ser classificadas em dois modelos distintos de supply chain: o modelo de fabricação distribuído e o modelo abrangente.

No mundo das empresas B2C, o supply chain geralmente se encaixa em uma dessas duas categorias. O modelo abrangente, caracterizado pelo controle extensivo sobre toda o supply chain, contrasta com o modelo distribuído, exemplificado por empresas, como a Apple, que terceirizam a maior parte dos processos de produção, mantendo atividades essenciais como branding e pesquisa e desenvolvimento.

Modelo abrangente: controle x grande volume de colaboradores

O modelo de produção abrangente busca conquistar o mercado utilizando exclusivamente recursos internos. Indústrias (como a BYD) que seguem esse modelo frequentemente se beneficiam de uma tomada de decisão mais ágil e maior controle sobre qualidade e inovação. A BYD, por exemplo, integrou seu sistema de acionamento elétrico combinando oito componentes em um módulo – algo que só pôde fazer por adotar essa abordagem abrangente.

O modelo, porém, tem algumas desvantagens. Uma delas é que pode deixar a organização inchada e ineficiente. A fábrica da BYD em Xi’an tem 250 mil funcionários e produz uma média de quatro carros por pessoa a cada ano – já na Gigafactory da Tesla em Xangai, 19 mil colaboradores entregam 500 mil carros por ano (uma média de 26 por pessoa). Um superdimensionamento como esse pode se tornar um problema durante crises econômicas.

Modelo distribuído: menos custos, mais concorrência

Por outro lado, o modelo distribuído depende das forças de mercado para que a empresa obtenha os melhores componentes de fornecedores especializados, promovendo eficiência e inovação. A abordagem da Apple, com a terceirização de quase todas as partes do processo de produção, é um exemplo. Sua estratégia permite que as organizações acessem recursos de alto nível sem arcar com os custos totais de desenvolvimento e produção, compartilhando riscos e benefícios com seus fornecedores.

Contudo, o modelo distribuído também tem seus desafios. A execução se torna menos eficiente porque é preciso gastar tempo e recursos para encontrar e gerenciar os fornecedores. Além disso, esses fornecedores podem explorar seu relacionamento com grandes marcas para atrair outros clientes, potencialmente beneficiando concorrentes.

Choque de modelos: BYD x Tesla

A BYD começou como fabricante de baterias e cresceu no modelo abrangente, uma abordagem que trouxe benefícios significativos – e uma margem de lucro bruto de 18,33% no primeiro semestre de 2023, superando os 18% da Tesla. 

A participação de mercado da BYD no setor de veículos elétricos na China subiu para 33,5%, um sucesso atribuído à sua alta capacidade de produção interna, cobrindo baterias, sistemas de propulsão elétrica e outros componentes críticos.

A Tesla, por outro lado, adotou um modelo distribuído de supply chain. No começo, teve dificuldade para garantir fornecedores de alto nível. Mas, à medida que cresceu, construiu um supply chain local robusto na China. 

Em 2022, a Tesla tinha bem menos fornecedores do que os fabricantes de automóveis tradicionais, refletindo sua abordagem mais enxuta e eficiente. Essa estratégia permite que a empresa mantenha flexibilidade e inovação, aproveitando as melhores tecnologias e fornecedores disponíveis no mercado.

Balanço: Ambos os modelos de supply chain têm seus méritos e desafios. A abordagem abrangente da BYD permite controle rigoroso e inovação rápida, fatores cruciais nas fases iniciais do desenvolvimento do setor. Por outro lado, o modelo distribuído da Tesla promove inovação e flexibilidade, o que pode ser vantajoso à medida que o setor amadurece e os padrões se solidificam.

A Xiaomi, recém-chegada ao mercado de veículos elétricos, beneficia-se da vantagem de entrar tardiamente nesse setor, pois aproveita tecnologias e hábitos de mercado já estabelecidos pelas empresas veteranas. Dessa forma, pode reduzir custos e evitar os desafios enfrentados por pioneiros como NIO e XPeng.

O cenário do supply chain de veículos elétricos na China é dinâmico, com a coexistência (e evolução) dos modelos abrangente e distribuído. O sucesso final desses modelos dependerá de fatores que vão além das estratégias de suprimentos – como qualidade, segurança, serviço pós-venda, experiência do usuário e sistemas operacionais. Embora seja cedo para declarar um vencedor definitivo, entender as forças e as fraquezas de cada modelo traz insights valiosos sobre o futuro da concorrência no setor de veículos elétricos.

À medida que o setor avança, as empresas devem equilibrar os benefícios do controle e da inovação, utilizando suas estratégias de supply chain para navegar esse mercado, altamente competitivo. Resta saber se a abordagem abrangente da BYD ou o modelo distribuído da Tesla prevalecerá – enquanto isso, ambos desempenham um papel crucial no crescimento e na evolução do setor de veículos elétricos na China.

Para ler o conteúdo original em inglês, clique aqui
Jennifer Huang
Jennifer Huang é professora de finanças e diretora acadêmica executiva do Programa de MBA da Cheung Kong Graduate School of Business (CKGSB).(https://english.ckgsb.edu.cn/faculty/huang-chunyan-jennifer/).