Do slogan bem-humorado (“É como leite, mas feito para humanos!”) aos produtos premium de leite de aveia, a entrada da sueca Oatly na China em 2017 foi ousada e estrategicamente planejada. Enfrentando desafios únicos em um mercado saturado de alternativas não lácteas (como o leite de soja), o sucesso da Oatly estava longe de ser garantido. 

No entanto, com um posicionamento inteligente, parcerias estratégicas e uma abordagem inovadora de marketing, a empresa conseguiu conquistar um nicho próspero na crescente indústria chinesa de alimentos à base de plantas.

Enfrentando o mercado chinês: desafios e oportunidades

Ao entrar na China, a Oatly encontrou desafios diferentes dos enfrentados na Europa e nos Estados Unidos, onde teve sucesso. Enquanto o leite de aveia se popularizou no Ocidente como um substituto do leite de vaca, os consumidores chineses, acostumados a opções vegetais acessíveis, como o leite de soja, mostraram menos entusiasmo. Posicionada ao lado de leites de soja de baixo custo nas prateleiras dos supermercados, a Oatly inicialmente teve dificuldades para atrair atenção, resultando em vendas fracas.

No entanto, David Zhang, presidente da Oatly para a Ásia-Pacífico, percebeu a necessidade de uma abordagem diferente. Ele identificou a crescente cultura do café na China como o ponto de entrada ideal. Ao direcionar sua estratégia para consumidores urbanos preocupados com sustentabilidade e dispostos a pagar um valor premium por alternativas inovadoras, Zhang transformou um possível revés em uma grande oportunidade.

Uma abordagem personalizada: a estratégia das “Três Unidades”

O grande avanço da Oatly se deve à sua estratégia das “Três Unidades”: uma cidade (Xangai), um mercado (cafés boutique) e um produto (o leite de aveia para baristas). Ao alinhar-se aos valores dos entusiastas do café, a Oatly destacou a textura superior e a capacidade de espumação do produto Barista – qualidades ideais para baristas na preparação de cafés especiais. Esse foco em qualidade e funcionalidade deu à Oatly uma vantagem no competitivo mercado de cafeterias.

Os resultados foram impressionantes. Até o final de 2022, a Ásia contribuiu com US$ 152,8 milhões para a receita global da Oatly, que totalizou US$ 722,3 milhões, sendo que 88% desse valor veio da China (ver Figuras 2 e 3). O produto Barista rapidamente se tornou o favorito entre os cafés boutique, impulsionando sua adoção e reforçando a associação da marca com qualidade premium e sustentabilidade.

Além disso, a Oatly incentivou os cafés a exibir placas promovendo o leite de aveia como uma alternativa premium ao leite de vaca. Essa estratégia não apenas despertou a curiosidade dos consumidores, mas também reforçou a mensagem da Oatly sobre responsabilidade ambiental e benefícios à saúde. Em poucos meses, centenas de cafeterias em Xangai passaram a oferecer bebidas à base de Oatly, impulsionando o crescimento orgânico e o boca a boca que rapidamente elevaram a marca ao destaque nacional.

Parcerias estratégicas impulsionam o crescimento

O sucesso da Oatly foi ainda mais acelerado por parcerias com grandes marcas. Até 2019, sua rápida ascensão chamou a atenção das principais redes de cafeterias na China, incluindo a Starbucks. 

Embora as negociações iniciais com a Starbucks na China continental tenham estagnado, a equipe de Zhang conseguiu fechar parcerias com unidades da Starbucks em Hong Kong e no Sudeste Asiático. Esse sucesso acabou convencendo a Starbucks China a assinar um acordo em 2020, ampliando significativamente a visibilidade da Oatly.

As colaborações da Oatly não pararam por aí. Parcerias com KFC, McDonald’s, Pizza Hut e Pacific Coffee fortaleceram ainda mais sua presença no setor de alimentos e bebidas da China. A maior visibilidade gerada por essas colaborações ajudou a Oatly a expandir sua distribuição para o varejo, incluindo supermercados e plataformas de comércio eletrônico, como o Tmall.

Para enfrentar desafios no supply chain, a Oatly investiu em instalações de produção locais, abrindo fábricas no leste da China e em Cingapura.

Um momento decisivo foi quando a Oatly redefiniu sua categoria de produto. Inicialmente confundida com leite de soja, a marca propôs a criação da categoria “proteína vegetal” no Tmall. Essa jogada estratégica culminou em uma campanha de grande sucesso no Dia dos Solteiros em 2018, na qual a Oatly esgotou 5.000 caixas em apenas 11 minutos. Esse sucesso não apenas destacou a demanda por alternativas à base de plantas na China, mas também reforçou a abordagem inovadora da Oatly no posicionamento de mercado.

Mantendo o sucesso em meio à crescente concorrência

À medida que o mercado de produtos à base de plantas na China crescia, a concorrência se intensificava. Marcas locais, como OAKIDOKI e Nongfu Spring, entraram no segmento, enquanto gigantes globais como Coca-Cola e Nestlé expandiram suas linhas de leite de aveia. 

Para manter sua vantagem, a Oatly redobrou seus esforços em iniciativas de sustentabilidade, incluindo o uso de energia renovável e caminhões elétricos, além de diversificar sua linha de produtos com sorvetes e produtos assados à base de aveia.

Para enfrentar desafios no supply chain, a Oatly investiu em instalações de produção locais, abrindo fábricas no leste da China e em Cingapura. Essas medidas não só reduziram os custos como também garantiram um fornecimento constante para atender à crescente demanda.

A estrada adiante

A experiência da Oatly na China destaca o papel crítico da adaptabilidade e da inovação ao navegar por um mercado dinâmico. Apesar de enfrentar interrupções no supply chain e uma concorrência crescente, a marca se consolidou como líder na categoria de produtos à base de plantas. Com a China priorizando a neutralidade de carbono e uma base de consumidores cada vez mais preocupada com o meio ambiente, o compromisso da Oatly oferece uma base sólida para o sucesso futuro.

Dito isso, o caminho à frente não está livre de obstáculos. Desde sua estreia no mercado de ações em 2021, que avaliou a empresa em US$ 13 bilhões, os desafios contínuos no supply chain afetaram fortemente o desempenho da Oatly, minando a confiança dos investidores e reduzindo o preço de suas ações. 

Além disso, a esperada recuperação pós-covid-19 na China ainda não se materializou, o que aumenta a pressão. Para enfrentar esses retrocessos, a Oatly anunciou uma mudança estratégica, focando em seu principal negócio de serviços alimentícios e firmando parcerias com pontos de venda selecionados em grandes cidades, ao mesmo tempo em que otimiza seu portfólio de produtos.

Apesar de enfrentar interrupções no supply chain e uma concorrência crescente, a marca se consolidou como líder na categoria de produtos à base de plantas.

O cenário competitivo também apresenta riscos. À medida que concorrentes domésticos e globais disputam participação de mercado, guerras de preços podem corroer a rentabilidade, e a Oatly precisa justificar consistentemente seu posicionamento premium para os consumidores. 

No entanto, com o mercado global de laticínios superando os US$ 1 trilhão, as oportunidades de crescimento continuam vastas. A capacidade da Oatly de manter sua vantagem de pioneirismo, inovar e responder às tendências de mercado em evolução será crucial para sustentar seu ímpeto.

A jornada da Oatly na China vai além da venda de leite de aveia. Ela representa um esforço ousado para redefinir as preferências dos consumidores, criar uma nova categoria de produto e promover a sustentabilidade. No futuro, o sucesso da Oatly dependerá de sua capacidade de inovar, nutrir a lealdade à marca e otimizar suas operações em um mercado cada vez mais competitivo e complexo.

Este artigo pertence ao livro Unleashing Innovation: Ten Cases from China on Digital Strategy and Market Expansion, da CKGSB Knowledge (em inglês)

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Teng Bingsheng e Wang Xiaolong
Teng Bingsheng é professor de gestão estratégica e vice-reitor de pesquisa estratégica na CKGSB. Wang Xiaolong é pesquisador sênior do Case Center da CKGSB.