Em 20 de janeiro de 2025, Donald Trump tomou posse como presidente dos Estados Unidos, acompanhado por diversos líderes do setor de tecnologia de seu país. Nesse mesmo dia, a DeepSeek.AI – empresa emergente de inteligência artificial da China – apresentou seu mais recente modelo de IA, o R1.

De saída, o R1 atraiu pouca atenção. No entanto, com o tempo, a importância desse modelo foi ficando mais clara. O R1 teve desempenho equivalente aos modelos mais recentes das principais empresas de IA americanas, como a OpenAI, mas exigia muito menos poder de computação e, portanto, era muito mais econômico. Como resultado, o custo de utilizá-lo era dramaticamente menor do que o proposto por seus concorrentes americanos.

Isso foi um divisor de águas.

Os modelos de IA tradicionais exigem um enorme poder de computação – que, por sua vez, depende de chips de alto desempenho. Consequentemente, as principais empresas de IA têm gastado enormes quantias para adquirir esses chips. O fornecedor dominante, a NVIDIA, viu sua receita e lucros dispararem nos últimos anos, tornando-se brevemente a empresa mais valiosa do mundo.

A DeepSeek se assemelha mais a uma organização sem fins lucrativos do que a uma empresa comercial – ironicamente, o oposto da OpenAI.

Diferentemente de outros players do setor, a DeepSeek levantou uma possibilidade intrigante com seu modelo R1: as empresas de IA podem não precisar mais acumular chips caros para manter um alto poder computacional. Essa startup chinesa basicamente inverte a lógica por trás da corrida armamentista de chips para IA. O impacto foi imediato — em 27 de janeiro de 2025, o preço das ações da NVIDIA despencou 17%, uma perda de quase US$ 600 bilhões em valor de mercado.

Uma obscura empresa de IA chinesa conseguiu desenvolver um produto de IA comparável aos das principais empresas americanas a uma fração do custo. Para o mundo – e, particularmente, para os Estados Unidos – foi um abalo sísmico. Logo, a pergunta passa a ser: como devemos interpretar o sucesso da DeepSeek?

Trocando os papéis

Curiosamente, a DeepSeek não foi inicialmente fundada como uma empresa comercial, mas como um subproduto de um fundo quantitativo de hedge chamado High-Flyer Quant. Registros públicos mostram que esse fundo foi criado em 2015 por Liang Wenfeng, ex-aluno da Universidade de Zhejiang, ao lado de colegas, enquanto a DeepSeek foi fundada por Liang em julho de 2023 (ou seja, ainda tem menos de dois anos).

Para contextualizar, a OpenAI, um dos maiores nomes da IA, foi fundada em 11 de dezembro de 2015, portanto, em breve celebrará seu décimo aniversário. Em 3 de outubro de 2024, a OpenAI garantiu US$ 6,6 bilhões em novo financiamento, elevando sua avaliação pós-investimento para US$ 157 bilhões (com alguns relatórios sugerindo que ela tenha alcançado US$ 300 bilhões desde então). No total, o financiamento da OpenAI já ultrapassou a marca de US$ 10 bilhões.

Em comparação, embora não se saiba quanto foi investido na DeepSeek, é seguro dizer que é bem menos do que os gastos da OpenAI, pois o High-Flyer Quant administra um fundo de US$ 8 bilhões, e a DeepSeek é totalmente financiada por ele. Por muitos critérios, a OpenAI e a DeepSeek são como um gigante e uma formiga.

No entanto, o que distingue a DeepSeek é que ela nunca foi movida por lucro – mas por curiosidade.

De fato, as descobertas mais revolucionárias frequentemente vêm da curiosidade, e não de aplicações práticas imediatas.

Ainda hoje, a curiosidade continua sendo a característica definidora da DeepSeek. Liang Wenfeng afirmou diversas vezes, em entrevistas, que sua motivação para fundar a DeepSeek foi pura curiosidade. Ao contratar novos funcionários, ele prioriza o nível de curiosidade acima de tudo.

Nesse sentido, a DeepSeek se assemelha mais a uma organização sem fins lucrativos do que a uma empresa comercial – ironicamente, o oposto da OpenAI, que foi inicialmente fundada como uma organização sem fins lucrativos, mas gradualmente fez a transição para um modelo voltado para o lucro à medida que se expandia.

Ao longo da história, muitos pesquisadores foram movidos pela busca de fama e fortuna, mas um número igualmente significativo foi motivado puramente pela curiosidade. De fato, as descobertas mais revolucionárias frequentemente vêm da curiosidade, e não de aplicações práticas imediatas.

Assim como Edwin Hubble observava o céu silencioso no Observatório Mount Wilson, na Califórnia, e por curiosidade identificou o fenômeno do desvio para o vermelho nas galáxias distantes, o que explica que o universo está se expandindo, Liang Wenfeng e sua equipe da DeepSeek são movidos pela curiosidade sobre as capacidades finais da IA e desenvolveram um produto de IA inovador.

O mundo precisa de mais curiosidades. Só com curiosidade teremos mais visionários como Liang Wenfeng e mais descobertas como a da DeepSeek.

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Professor de Economia, Vice-Reitor para Ásia e Oceania, Diretor do Centro de Casos e Diretor do Centro de Pesquisa em Economia de Big Data, Cheung Kong Graduate School of Business (CKGSB). PhD pela Universidade de Michigan.